domingo, maio 14, 2006

O valor das coisas

Há duas semanas atrás, um dos candidatos que eu validei deixou uma coisa para mim no CRVCC.

Dentro de um saco de papel vermelho estava uma peça de plástico cor de laranja.

Era feia, de resto, diga-se: uma peça de uma máquina eléctrica, redonda, cor de laranja industrial, em forma de copo com várias divisões internas. Por baixo tinha gravado toscamente o nome do adulto que a tinha ofertado.

Pensei de mim para mim que ali estava uma coisa para guardar num local bem longe da vista o mais rapidamente possível... Nem pensar em substituir o meu copo das canetas tão catita por "aquilo"...!

Juntamente com o copo vinha uma carta. Estava, como é óbvio, dirigida "à Dr.ª Helena" e visava agradecer o cuidado que tinha tido com aquele candidato e explicar a oferenda, que ele insistia, não era uma "prenda", mas um "simbolozinho".

Dizia saber que a peça era deveras feia, que, se sobesse pintar, te-la-ia colorido para a tornar mais apelativa, mas na verdade não tinha grande talento para esse tipo de actividades.
Depois, continuava. Dizia que eu não devia, porém, deixar-me convencer pelo aspecto da peça que, na realidade, era muito útil: tinha vários compartimentos que davam para clips, canetas azuis, pretas, de cor, lápis, borrachas, etc., e era resistente.

Aquela peça em particular estivera na sua secretária de trabalho durante os 27 anos que tinha permanecido na fábrica que o despedira há dois anos e sempre lhe tinha dado muito jeito. Disse que queria que eu ficasse com ela e que tinha uma outra similar em casa que tinha um pequeno defeito, mas que ele não se importava. E depois pedia subtilmente que eu tratasse a peça com o mesmo carinho que ele.

A peça não deixa de ser feia, mas desde então sou incapaz de a retirar da minha secretária e transferi para ela as minhas canetas e lápis. Sempre que olho para ela sinto um certo respeito pela sua fealdade, porque lembro-me do que ela representa e apesar de não gostar do seu aspecto, gosto imenso da peça.


Faz-nos pensar, não é? As dádivas não valem só pelo que são, mas sobretudo pela forma com que são dadas...

2 comentários:

ponto azul disse...

Olá!Já vi que estás a dar formação no RVCC!Espero que corra tudo bem, e sim, são mesmo pessoas especiais...e esta cena da prenda só nos faz lembrar o quanto somos diferentes e mesmo assim tão semelhantes na sensibilidade!Bjs :-)

Anónimo disse...

:)
(e sem palavras)